E não apenas. Estavam na mente de todos os picoenses as erupções vulcânicas de 1718 e 1720, quando, em 1725, um ciclone marítimo assolou a Vila das Lajes. Assim o descreve Silveira de Macedo: O ano de 1725 foi memorável para os habitantes da villa das Lages do Pico por uma tempestade marítima que lhes inundou a villa causando muitos estragos nos dias 14 a 20 de abril, por cujo motivo fizeram aquelles povos um solene voto ao Bom Jesus das preces (cuja imagem tem em muita devoção) o qual ainda hoje (1871) cumprem no dia 25 de março (deve referir-se a 19 de Abril). (1)
Referenciando a Imagem do Bom Jesus das Preces, diz ainda, em nota de roda-pé: Consta que esta Imagem fora também arrojada pelo mar à praia daquella villa pelo mesmo tempo que fora a outra simelhante à Praia do Almoxarife na ilha do Fayal o que faz julgar terem ambas a mesma procedência. (2)
Segundo a tradição, o mesmo aconteceu com a imagem que se venera na igreja paroquial de Santa Cruz das Ribeiras.
Realmente, a vila das Lajes passou a ser invadida pelo mar, quando tempestuoso, porque lhe foram retirando, ao longo do tempo, os calhaus que circundavam a costa, para as construções urbanas e outras que se foram construindo ao longo dos tempos.
Ficou registado na memória dos picoenses o ciclone de 31 de Agosto de 1893, que provocou grandes estragos e destruíu as culturas da ilha, provocando a fome em muitos lares. Valeu nessa altura a benemerência de muitas pessoas estranhas, entre elas D. Rosa Dabney, residente na Horta, que importou grandes quantidades de milho dos Estados Unidos e o fez distribuir pelas populações famintas.
Já em nossos dias foi bastante violento o ciclone de 9 de Agosto de 1935(?), que destruiu a muralha de defesa que circundava a Lagoa, levando o Governo de então a construir a excelente muralha em basalto trabalhado, o que veio dar maior segurança àquela zona. Mas o resto da Vila ficou aberto às tempestades cíclicas que no Inverno acontecem com frequência, e que causam muitas preocupações e angústias. Os lajenses nunca deixaram de reclamar uma maior segurança para seus bens e haveres, especialmente as habitações fronteiriças ao mar.
De tanto reclamar resultou, a meados do século passado, a construção de quatro “quebra-mares” a meio do chamado Juncal, que, afinal, nenhum efeito deram. O mar, quando bravo, umas das vezes “veio cá acima”, como diz o povo, e andou a “bailar” com os molhes. Valeu a decisiva visão do Ministro Arantes e Oliveira que ordenou o alteamento do muro de defesa que havia sido construído em 1914.
Antes da Câmara Municipal abrir o ramal de saída pelo Sul e, conjuntamente, a muralha que rodeia actualmente a lagoa da Maré, o mar invadia com frequência aquela parte da Vila, chegando, por vezes, quase ao Largo Gen. Lacerda Machado.
Consta mesmo que a antiga igreja Matriz, construída por volta de 1506, e que ocupava o local onde se encontra a actual, ficou muito danificada pelas várias invasões de mar, chegando, não raro, a deixar peixes em cima dos altares. (A minha avó assim m’o dizia).
Agora chegou o embelezamento ou urbanização da zona Oeste da Vila, que deixou de ser utilizada, depois do campo de jogos ter sido transferido para Santa Catarina. Esperamos que o mar não volte a fazer das suas proezas, invadindo de novo a parte baixa da Vila.
Aquando do ciclone de 1935, atrás referido, que destruiu a muralha e algumas casas do Portinho, Ribeira do Meio, a Imagem do Senhor Jesus das Preces, saiu em procissão de penitência pelas ruas da vila, trazida pelo Vigário e Ouvidor de então, Pe. José Vieira Soares, de saudosa memória, a implorar a clemência divina. E durante muitos anos, até cerca de 1960, fazia-se a secular procissão das Preces, no dia 19 de Abril. Acabou quando num certo ano não houve quem conduzisse o andor. Hoje a veneranda Imagem encontra-se no altar principal da Matriz.
- Macedo, António L. Silveira de – “História das Quatro Ilhas q. Formam o Distrito da Horta” -1871, pág.219.
- Ibidem, 220
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